Jornal Médico - Imunização no doente respiratório crónico e a evolução da vacinação antigripal em Portugal

O programa do 35.º Congresso Nacional de Pneumologia contou com uma sessão dedicada à vacina contra a gripe e à doença respiratória, copatrocinada pela Sanofi Pasteur e na qual foi palestrante o pneumologista do Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Norte - Polo Hospital Pulido Valente, Filipe Froes. O especialista deu início à sessão lembrando que entre as 10 maiores ameaças globais à saúde humana enunciadas pela Organização Mundial de Saúde, “a Pneumologia está envolvida em seis: a poluição do ar e mudança climática; as doenças crónicas não transmissíveis, como a doença pulmonar obstrutiva crónica (DPOC); a pandemia global de gripe; a resistência aos antimicrobianos (as infeções respiratórias são a principal causa de utilização – devida ou indevida – de antibióticos); as manifestações pulmonares do vírus da imunodeficiência humana (VIH) e a hesitação na vacinação”. A vacinação contra a gripe Entre as seis ameaças globais à saúde a que a Pneumologia se encontra associada, o preletor destacou a pandemia global da gripe, recordando que “a melhor maneira de nos prepararmos é, todos os anos, estarmos preparados para a gripe sazonal”. Em Portugal, “na vacinação sazonal da gripe dá-se mais importância aos grupos de risco, mas há países em que a vacinação sazonal é para toda a população”. De acordo com o pneumologista, “é necessário adequar as possibilidades de aquisição de vacina ao número de pessoas e garantir um dos pilares da sustentabilidade do SNS – equidade – dar mais a quem mais precisa. Neste caso, os grupos de risco são os que precisam mais de serem vacinados, mas todos beneficiam da vacina”. Numa parceria entre a Sociedade Portuguesa de Pneumologia e a Associação Portuguesa de Medicina Geral e Familiar, com o apoio da Sanofi, em 2009 foi criado o Vacinómetro, considerando a importância da sensibilização e da monitorização da vacinação contra a gripe. Nas palavras do especialista, o Vacinómetro é “uma ferramenta que permite, em tempo útil, monitorizar a cobertura vacinal dos quatro grupos prioritários da vacinação: pessoas com mais de 65 anos, pessoas com doença crónica, pessoas com idades entre os 60 e os 64 anos e profissionais de saúde”. “Este ano, o Vacinómetro monitoriza, mais uma vez, uma população de cerca de 2200 indivíduos, em quatro momentos de avaliação”, salientou. O primeiro momento, em finais de outubro, marca o arranque da época de vacinação; o segundo, no final de novembro, avalia o fim do período principal de vacinação; o terceiro, no final de dezembro, faz uma avaliação global; o quarto, no final de fevereiro, faz o balanço final. Assim, o Vacinómetro “avalia, em momentos chave, a taxa de vacinação da população de risco”. Permite, também, “uma melhor preparação no combate à gripe e às suas complicações, através do aumento da taxa de cobertura vacinal da população com maior risco de complicações da infeção pelo vírus influenza”, destacou o orador. Através dos dados do Vacinómetro, verifica-se que, “nos últimos 10 anos, as taxas de cobertura vacinal contra a gripe em Portugal foram oscilando. Neste momento, 60-70 % da população com mais de 65 anos está vacinada e este valor tem-se mantido estável com pequenas flutuações. Portugal está entre os cinco países com as mais elevadas taxas de cobertura de vacinação contra a gripe, na população com mais de 65 anos”, salientou o especialista. O papel dos profissionais de saúde Na opinião de Filipe Froes, “os profissionais de saúde são a chave do sucesso quer no combate à gripe, quer na capacidade para melhorar os resultados. Os profissionais de saúde representam três fatores essenciais no aumento da taxa de cobertura vacinal: proteção individual (são os profissionais mais expostos à gripe, através do contacto direto com os doentes), proteção familiar (muitas vezes transmitem a gripe aos cônjuges e filhos) e prescrição da vacinação, dando o exemplo da sua própria vacinação”. O Vacinómetro indica que “o principal fator associado à implementação da vacinação é a recomendação do profissional de saúde”. Atualmente, num total de cerca de dois milhões de vacinas da gripe administradas em Portugal, “a maioria é administrada nos cuidados de saúde primários”. Quando a vacina é comprada na farmácia, a maior parte das pessoas faz a administração neste estabelecimento. “A possibilidade de vacinação na farmácia foi também um fator que decididamente contribuiu para o aumento da taxa de cobertura vacinal”, realçou. A eficácia/efetividade da vacina da gripe “A vacina contra a gripe é eficaz, mas a sua eficácia varia. A capacidade de prevenir a doença oscila entre 60 a 70% na população jovem”, contudo, com o avançar da idade, “o sistema imunológico entra num processo de imunossenescência, fazendo com que a boa eficácia vacinal numa população com mais de 65 anos, para qualquer vacina, ronde os 40-50%”. Portanto, a eficácia da vacina contra a gripe “tem de ser avaliada de acordo com as características do hospedeiro”. Mais concretamente, “a vacina é eficaz, mas depende do hospedeiro e da concordância antigénica, podendo apresentar variações de eficácia num indivíduo mais jovem ou mais idoso”, reforçou o pneumologista. O impacto da gripe De acordo com os dados do European Centre for Disease Prevention and Control (ECDC), “o vírus influenza é, atualmente, o primeiro agente infeccioso com carga de doença na União Europeia”. Em termos mundiais, a gripe “está associada a cerca de 5 milhões de casos graves anualmente e – direta ou indiretamente – a cerca de 650 000 óbitos por ano”, informou o preletor. “O Global Burden of Disease Study, publicado na revista The Lancet, mostrou que a gripe não está entre as 10 primeiras causas de morte”, contudo, “a gripe é, frequentemente, o fator precipitante de muitos óbitos por enfarte agudo do miocárdio, DPOC, pneumonia e diabetes”, clarificou. O Centers for Disease Control and Prevention (CDC) afirma que, “muitas vezes, não se valoriza gripe porque se avaliam as causas de morte pelas comorbilidades e não pelo fator que precipita a descompensação”. “Todos os anos, no período de atividade gripal verifica-se um excesso de mortalidade. Em Portugal, está documentado um aumento dos internamentos por pneumonia que coincidiu com a atividade gripal”, afirmou. No Canadá, o estudo “Acute Myocardial Infarction after Laboratory-Confirmed Influenza Infection” concluiu que “na semana após uma infeção respiratória viral houve um aumento de seis vezes na taxa de internamento por enfarte agudo do miocárdio”. Verificou-se também que “os vírus respiratórios mais implicados neste aumento eram o vírus influenza B e A”. Portanto, na perspetiva do pneumologista, “há evidência mais do que suficiente de que a gripe é um fator determinante do enfarte agudo do miocárdio” e que “é uma doença com um profundo impacto em termos de saúde pública”. Vírus influenza B: A nova ameaça? “O vírus influenza B é um fator importante e o aumento da cobertura das vacinas justifica-se”, afirmou Filipe Froes. Este vírus “está associado a carga da doença e sobretudo a carga da doença cardiovascular”, uma vez que “é o mais associado ao enfarte agudo do miocárdio”. Segundo o pneumologista, “o vírus influenza B é um vírus cada vez mais importante e é necessário perceber a sua fisiopatologia, pois, ao contrário do que se pensava, pode ter características pandémicas”. Mensagem final No final da sessão, Filipe Froes reforçou que “a vacina contra a gripe é eficaz e é a medida mais importante para prevenir as complicações desta infeção. A sua eficácia depende do hospedeiro, do tipo de vacina e da concordância antigénica”. De acordo com o pneumologista, “a gripe é uma doença com significativo impacto individual, coletivo e económico e o vírus influenza B é, indiscutivelmente, uma nova ameaça”.

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