Jornal Médico - Ministério quer segurar internos no SNS por via contratual

A tutela est&aacute; decidida a criar contratos com cl&aacute;usulas de perman&ecirc;ncia para os m&eacute;dicos internos... A tutela est&aacute; decidida a criar contratos com cl&aacute;usulas de perman&ecirc;ncia para os m&eacute;dicos internos, a fim de evitar qualquer possibilidade de uma sa&iacute;da massificada do Servi&ccedil;o Nacional de Sa&uacute;de para os privados, ap&oacute;s a conclus&atilde;o do internato. Ainda este m&ecirc;s dever&aacute; ser aprovado um Decreto-Lei para regulamentar esta mat&eacute;ria. Para j&aacute;, a medida consta apenas numa resolu&ccedil;&atilde;o do Conselho de Ministros publicada em Di&aacute;rio da Rep&uacute;blica, na qual se estipula que quem acede ao internato da especialidade fica comprometido, posteriormente, a trabalhar no Servi&ccedil;o Nacional de Sa&uacute;de durante um per&iacute;odo similar ao da forma&ccedil;&atilde;o p&oacute;s-graduada. Sindicatos e Ordem garantem que a medida n&atilde;o faz qualquer sentido, uma vez que a maioria dos internos deseja ficar vinculada ao sector p&uacute;blico, se as condi&ccedil;&otilde;es de trabalho forem as adequadas Ap&oacute;s a reuni&atilde;o do Conselho de Ministros (CM), no passado dia 15 de Dezembro, ficou a saber-se que o governo pretende avan&ccedil;ar com cl&aacute;usulas de fideliza&ccedil;&atilde;o ao SNS em futuros contratos a celebrar com m&eacute;dicos internos. De acordo com a resolu&ccedil;&atilde;o aprovada pelo executivo de Jos&eacute; S&oacute;crates, qualquer interno que n&atilde;o cumpra um n&uacute;mero m&iacute;nimo de anos no Servi&ccedil;o Nacional de Sa&uacute;de (SNS) ap&oacute;s completar o seu ciclo de forma&ccedil;&atilde;o fica obrigado a indemnizar o Estado. Uma medida semelhante &agrave; que levou &agrave; cria&ccedil;&atilde;o das vagas protocoladas e posteriormente &agrave;s vagas preferenciais, mas aparentemente com cariz obrigat&oacute;rio para todos os internos. Embora a ideia n&atilde;o passe ainda disso mesmo, de uma "ideia", a verdade &eacute; que na Resolu&ccedil;&atilde;o do Conselho de Ministros n.&ordm; 101-A/2010, publicada em Di&aacute;rio da Rep&uacute;blica no dia 27 de Dezembro, surge listada, entre as medidas de consolida&ccedil;&atilde;o e controlo or&ccedil;amental, a necessidade de "determinar que os m&eacute;dicos que acedam ao internato da especialidade no SNS ficam obrigados ap&oacute;s a sua conclus&atilde;o a permanecer em fun&ccedil;&otilde;es no SNS, pelo per&iacute;odo m&iacute;nimo igual ao tempo da sua forma&ccedil;&atilde;o p&oacute;s-graduada". No documento &eacute; tamb&eacute;m fixado que "a desonera&ccedil;&atilde;o da obriga&ccedil;&atilde;o, a pedido do interessado, depende da fixa&ccedil;&atilde;o de uma indemniza&ccedil;&atilde;o ao Estado, tendo em considera&ccedil;&atilde;o o custo da respectiva forma&ccedil;&atilde;o". Sindicatos querem conhecer melhor a medida De acordo com S&eacute;rgio Esperan&ccedil;a, presidente da comiss&atilde;o executiva da Federa&ccedil;&atilde;o Nacional dos M&eacute;dicos (FNAM), os sindicatos m&eacute;dicos est&atilde;o atentos a esta quest&atilde;o, mesmo que tenham sido apanhados desprevenidos num primeiro momento: "estamos a trocar opini&otilde;es relativamente a esta situa&ccedil;&atilde;o. Fomos surpreendidos por esta not&iacute;cia, uma vez que da parte do Minist&eacute;rio n&atilde;o houve, at&eacute; ao momento, qualquer abordagem sobre esta mat&eacute;ria com os sindicatos. Sabemos que o SIM tamb&eacute;m desconhecia esta inten&ccedil;&atilde;o, uma vez que j&aacute; troc&aacute;mos algumas ideias sobre o assunto". De uma forma gen&eacute;rica, o sindicalista julga que a cl&aacute;usula de perman&ecirc;ncia n&atilde;o faz sentido: "os m&eacute;dicos que terminam a sua forma&ccedil;&atilde;o e adquirem o grau de especialista, devem ser, de facto, integrados no SNS atrav&eacute;s dos concursos. &Eacute; por isso que estamos a discutir com o Minist&eacute;rio os regulamentos de concursos (suponho que ser&aacute; poss&iacute;vel chegar a um acordo final na pr&oacute;xima reuni&atilde;o, em Janeiro). &Eacute; essa a via que consideramos a mais adequada para conquistar profissionais qualificados para o SNS, em n&uacute;mero suficiente. Trata-se de uma reivindica&ccedil;&atilde;o nossa desde h&aacute; algum tempo, uma vez que nos dois &uacute;ltimos anos essa integra&ccedil;&atilde;o n&atilde;o tem estado a acontecer". S&eacute;rgio Esperan&ccedil;a explica ainda que a medida ter&aacute; de ser analisada em pormenor, depois de o Minist&eacute;rio apresent&aacute;-la aos seus interlocutores naturais: "os sindicatos tamb&eacute;m representam os m&eacute;dicos internos e, portanto, devem ser ouvidos. Tem de existir uma negocia&ccedil;&atilde;o sobre estes aspectos contratuais. N&atilde;o &eacute; de modo leviano que se vai legislar sobre um aspecto importante na vida dos m&eacute;dicos, sem uma negocia&ccedil;&atilde;o pr&eacute;via com os sindicatos". Possibilidade n&atilde;o &eacute; posta de lado... Pese considerar in&uacute;til a medida apresentada pelo Governo, a FNAM n&atilde;o exclui por completo a possibilidade de estes contratos de fideliza&ccedil;&atilde;o avan&ccedil;arem, desde que acarretem vantagens para os internos: "&eacute; preciso conhecer, em rigor, o que se exige dos internos (de que tipo de v&iacute;nculo estamos falar e por quanto tempo), o que &eacute; oferecido como moeda de troca para o futuro consolidado da carreira m&eacute;dica, assim como detalhes associados a hor&aacute;rios, condi&ccedil;&otilde;es salariais, etc.", aponta S&eacute;rgio Esperan&ccedil;a. O presidente da FNAM alerta tamb&eacute;m para o risco de estes contratos de fideliza&ccedil;&atilde;o poderem ser utilizados para manter a massa salarial dos jovens m&eacute;dicos em valores reduzidos: "os m&eacute;dicos auferem um determinado vencimento ao longo do internato e, depois, quando passam a especialistas, os contratos que lhe s&atilde;o oferecidos apresentam valores baixos e verifica-se uma perda de remunera&ccedil;&atilde;o substancial. Isto tem trazido s&eacute;rias complica&ccedil;&otilde;es em especialidades com a Medicina Geral e Familiar e contribui para que os m&eacute;dicos abandonem o SNS e procurem outras alternativas. Esperemos que esta medida do governo n&atilde;o seja uma maneira de querer perpetuar o exerc&iacute;cio profissional dos m&eacute;dicos com remunera&ccedil;&otilde;es baixas". OM v&ecirc; fideliza&ccedil;&atilde;o como in&uacute;til e impositiva Dentro da Ordem dos M&eacute;dicos (OM) parece existir um consenso sobre o desfasamento de uma eventual cl&aacute;usula de perman&ecirc;ncia para os internos, numa altura em que a generalidade dos m&eacute;dicos que termina a sua especializa&ccedil;&atilde;o manifesta interesse em permanecer vinculada ao SNS. Isabel Caixeiro: internos j&aacute; pagam pelo internato Isabel Caixeiro, presidente da Sec&ccedil;&atilde;o Regional do Sul da OM e candidata a baston&aacute;ria daquela institui&ccedil;&atilde;o, aguarda que a tutela assuma uma atitude respons&aacute;vel e dialogante: "teremos que esperar pela sa&iacute;da do Decreto-Lei, mas espero que o Minist&eacute;rio da Sa&uacute;de tenha o bom senso de dialogar com a Ordem sobre esta mat&eacute;ria. &Agrave; partida, parece-me que esta &eacute; uma p&eacute;ssima ideia, porque n&atilde;o &eacute; com obrigatoriedades que vamos conseguir fixar os m&eacute;dicos mais jovens nos locais onde eles s&atilde;o necess&aacute;rios. Ali&aacute;s, viu-se qual foi o resultado das vagas protocoladas. Nas regi&otilde;es aut&oacute;nomas, alguns colegas optaram por essas vagas e depois abandonaram-nas. A situa&ccedil;&atilde;o tem sido, desde ent&atilde;o, dirimida em tribunal e nunca mais se chega a um desfecho". A presidente da Sec&ccedil;&atilde;o Regional do Sul da OM, Isabel Caixeiro, considera m&aacute;, a proposta dos contratos de fideliza&ccedil;&atilde;o e recorda como, no passado, as vagas protocoladas quase nada trouxeram de positivo Por outro lado, Isabel Caixeiro sublinha que os internos, durante o seu per&iacute;odo formativo, j&aacute; pagam em grande medida com o seu tempo e dedica&ccedil;&atilde;o, qualquer d&iacute;vida que pudessem ter para com o SNS: "n&atilde;o podemos esquecer que os internos, mesmo quando est&atilde;o em forma&ccedil;&atilde;o, est&atilde;o a trabalhar e a contribuir para os resultados do SNS. Mais: com a aposenta&ccedil;&atilde;o de muitos colegas, s&atilde;o os internos que acabam por assegurar muito do trabalho dos servi&ccedil;os. Por isso, penso ser extremamente injusto exigir que paguem em tempo extra, para al&eacute;m do trabalho que j&aacute; realizam. O que &eacute; preciso &eacute; encontrar outros mecanismos de fixa&ccedil;&atilde;o e motiva&ccedil;&atilde;o para que os jovens m&eacute;dicos fiquem no SNS, nomeadamente atrav&eacute;s da garantia de melhores condi&ccedil;&otilde;es de trabalho e da constru&ccedil;&atilde;o de carreiras que lhes permitam ter uma evolu&ccedil;&atilde;o profissional ao longo da vida". Jos&eacute; Manuel Silva: Hospitais encerrariam sem o trabalho dos internos J&aacute; Jos&eacute; Manuel Silva (igualmente candidato &agrave; lideran&ccedil;a da OM e presidente da Sec&ccedil;&atilde;o Regional do Centro) pensa que os contratos de fideliza&ccedil;&atilde;o t&ecirc;m de ser objecto de negocia&ccedil;&atilde;o apurada "entre a tutela, os sindicatos e os jovens m&eacute;dicos e seus representantes". No entender do dirigente da OM, o Minist&eacute;rio da Sa&uacute;de tem de admitir uma realidade que hoje &eacute; mais do que &oacute;bvia: "os internos, durante o seu per&iacute;odo formativo, n&atilde;o est&atilde;o exclusivamente em forma&ccedil;&atilde;o, j&aacute; que nessa fase trabalham para o Estado. Os hospitais e as urg&ecirc;ncias encerrariam, se n&atilde;o tivessem o apoio dos internos. N&atilde;o haja d&uacute;vidas, se o Estado decidisse que n&atilde;o pagaria forma&ccedil;&atilde;o aos internos, os hospitais fechavam e o sistema baqueava! Embora com menos peso - por for&ccedil;a da organiza&ccedil;&atilde;o do internato - tamb&eacute;m alguns centros de sa&uacute;de sentiriam dificuldades, caso deixassem de receber internos. Tudo isto significa que os internos est&atilde;o a desempenhar fun&ccedil;&otilde;es relevantes e essenciais ao funcionamento do SNS. Ou seja, est&atilde;o a pagar a sua forma&ccedil;&atilde;o com o seu trabalho". Para Jos&eacute; Manuel Silva, presidente da Sec&ccedil;&atilde;o Regional do Centro da OM, o Minist&eacute;rio da Sa&uacute;de deve ter em mente que os internos j&aacute; pagam um alto pre&ccedil;o pela sua forma&ccedil;&atilde;o (por via das horas de trabalho cumpridas) e que hospitais e urg&ecirc;ncias teriam de encerrar portas, se lhes fossem retirados os internos que ali prestam servi&ccedil;o Assim sendo, Jos&eacute; Manuel Silva n&atilde;o entende aqueles que pensam que o Estado est&aacute; a fazer um favor aos internos, ao proporcionar-lhes forma&ccedil;&atilde;o, at&eacute; porque o treino dos m&eacute;dicos &eacute; "um valor fundamental para o pa&iacute;s". O candidato a baston&aacute;rio afirma ainda que "o car&aacute;cter impositivo da medida n&atilde;o se justifica", sobretudo quando se sabe que o Estado tem nos &uacute;ltimos anos actuado de forma contraproducente e "criado dificuldades &agrave; perman&ecirc;ncia dos internos no SNS, particularmente na Medicina Geral e Familiar. Tal comportamento faz com que muitos jovens especialistas sejam obrigados a deixar o SNS para irem trabalhar no sector privado, porque n&atilde;o lhes s&atilde;o dadas condi&ccedil;&otilde;es contratuais m&iacute;nimas para ficar no SNS, apesar de essa ser a sua vontade". Em conclus&atilde;o, Jos&eacute; Manuel Silva aconselha a tutela a recentrar as suas prioridades: "o Estado devia come&ccedil;ar por gerar condi&ccedil;&otilde;es contratuais, t&eacute;cnicas e cient&iacute;ficas para que os jovens especialistas possam permanecer no SNS, porque esse &eacute; o desejo da esmagadora maioria". APMCG vai estar atenta A Associa&ccedil;&atilde;o Portuguesa de M&eacute;dicos de Cl&iacute;nica Geral (APMCG) tem acompanhado, de perto, as not&iacute;cias sobre a cria&ccedil;&atilde;o de contratos de fideliza&ccedil;&atilde;o para os internos que realizam a sua forma&ccedil;&atilde;o p&oacute;s-graduada no Servi&ccedil;o Nacional de Sa&uacute;de (SNS). Uma altera&ccedil;&atilde;o que n&atilde;o tem necessariamente de ser encarada como 100% negativa, como afirma Susana Medeiros, directora do Departamento de Internos e Jovens M&eacute;dicos de Fam&iacute;lia da APMCG: "naturalmente, esta quest&atilde;o n&atilde;o pode ser vista de forma linear. H&aacute; v&aacute;rios aspectos que dever&atilde;o ser cuidadosamente analisados. No entanto, se bem orientada e regulada, a medida poder&aacute; ser favor&aacute;vel aos jovens m&eacute;dicos de fam&iacute;lia. Ser&aacute; fundamental que esta proposta permita uma correcta regulamenta&ccedil;&atilde;o do final do internato, uma coloca&ccedil;&atilde;o justa e condigna dos especialistas em MGF e que cada rec&eacute;m-especialista possa exercer e p&ocirc;r em pr&aacute;tica a sua forma&ccedil;&atilde;o. S&oacute; assim poder&aacute; ser uma cl&aacute;usula justa e que beneficiar&aacute;, quer o SNS, quer cada profissional". Susana Medeiros garante que, em caso algum, a APMCG deseja ficar de fora da concretiza&ccedil;&atilde;o de qualquer mudan&ccedil;a de fundo que venha a acontecer neste campo: "acima de tudo, o Departamento de Internos e Jovens M&eacute;dicos de Fam&iacute;lia estar&aacute; atento ao desenrolar desta medida e est&aacute; dispon&iacute;vel para negociar com a tutela o modus operandi". A respons&aacute;vel do Departamento de Internos e Jovens M&eacute;dicos de Fam&iacute;lia j&aacute; teve oportunidade, igualmente, de reflectir sobre a publica&ccedil;&atilde;o em Di&aacute;rio da Rep&uacute;blica, no final de Dezembro, do despacho 19083/2010. Um diploma que possibilita a prorroga&ccedil;&atilde;o do contrato em fun&ccedil;&otilde;es p&uacute;blicas a tempo resolutivo incerto dos internos que terminam, em 2011, a especialidade de MGF (considerada carenciada) e que &eacute; o primeiro passo para a garantia de processos concursais bem sucedidos. Um despacho que este ano surge mais cedo do que &eacute; habitual, pressagiando maior celeridade nos concursos de coloca&ccedil;&atilde;o. "A brevidade e qualidade dos concursos e respectivas coloca&ccedil;&otilde;es, bem como a hip&oacute;tese de haver um concurso a n&iacute;vel nacional, t&ecirc;m sido preocupa&ccedil;&otilde;es do Departamento de Internos e Jovens M&eacute;dicos de Fam&iacute;lia, tendo este aspecto sido, por mais do que uma vez, manifestado &agrave; tutela. A publica&ccedil;&atilde;o atempada sugere uma preocupa&ccedil;&atilde;o da tutela face a esta quest&atilde;o", adianta Susana Medeiros. Ainda assim, a dirigente gostaria que os "concursos de entrada dos rec&eacute;m-especialistas fossem regulamentados e que n&atilde;o se tivesse de aguardar, todos os anos, por um despacho".

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